UMA IDEIA TODA AZUL Marina Colasanti

 

                                                                         
                                                                                                                                    https://www.amazon.com.br/

            

           Um dia o Rei teve uma ideia.
           Era a primeira da vida toda, e tão maravilhado ficou com aquela ideia azul, que não quis saber de contar aos ministros. Desceu com ela para o jardim, correu com ela nos gramados, brincou com ela de esconder entre outros pensamentos, encontrando-a sempre com igual alegria, linda ideia dele toda 
azul.
          Brincaram até o Rei adormecer encostado numa árvore.
          Foi acordar tateando a coroa e procurando a ideia, para perceber o perigo. Sozinha no seu sono, solta e tão bonita, a ideia poderia ter chamado a atenção de alguém. Bastaria esse alguém pegá-la e levar. É tão fácil roubar uma ideia. Quem jamais saberia que já tinha dono?
          Com a ideia escondida debaixo do manto, o Rei voltou para o castelo. Esperou a noite. Quando todos os olhos se fecharam, saiu dos seus aposentos, atravessou salões, desceu escadas, subiu degraus, até chegar ao Corredor das Salas do Tempo. Portas fechadas, e o silêncio. Que sala escolher?
          Diante de cada porta o Rei parava, pensava, e seguia adiante. Até chegar à Sala do Sono. Abriu. Na sala acolchoada, os pés do Rei afundavam até o tornozelo, o olhar se embaraçava em gazes, cortinas e véus pendurados como teias. Sala de quase escuro, sempre igual. O Rei deitou a ideia adormecida na cama de marfim, baixou o cortinado, saiu e trancou a porta.
          A chave, prendeu no pescoço em grossa corrente. E nunca mais mexeu nela.
          O tempo correu seus anos. Ideias o Rei não teve mais, nem sentiu falta, tão ocupado estava em governar. Envelhecia sem perceber, diante dos educados espelhos reais que mentiam a verdade. 
          Apenas, sentia-se mais triste e mais só, sem que nunca mais tivesse tido vontade de brincar nos jardins.
          Só os ministros viam a velhice do Rei. Quando a cabeça ficou toda branca, disseram-lhe que já 
podia descansar e o libertaram do manto.
          Posta a coroa sobre a almofada, o Rei logo levou a mão à corrente.
         – Ninguém mais se ocupa de mim – dizia atravessando salões e descendo escadas a caminho das Salas do Tempo – ninguém mais me olha. Agora posso buscar minha linda ideia e guardá-la só para 
mim.
          Abriu a porta, levantou o cortinado.
          Na cama de marfim, a ideia dormia azul como naquele dia. E linda. Mas o Rei não era mais o Rei daquele dia. Entre ele e a ideia estava todo o tempo passado lá fora, o tempo todo parado na Sala do Sono. Seus olhos não viam na ideia a mesma graça. Brincar não queria, nem rir. Que fazer com ela? Nunca mais saberiam estar juntos como naquele dia.
          Sentado na beira da cama o Rei chorou suas duas últimas lágrimas, as que tinha guardado para a maior tristeza. Depois baixou o cortinado, e deixando a ideia adormecida, fechou para sempre a porta.

                                                                                                          (COLASANTI, Marina. Uma ideia toda azul. São Paulo, Global, 2005.)

 

1) É possível inferir sobre o conto:

a) retrata a trajetória de vida do rei da juventude até a velhice.
b) envolve o leitor descrevendo a vida real em minúcias.
c) descreve o reinado de forma irônica.
d) amplia o universo da história com a inserção de atitudes intempestivas do rei.
e) expõe o rei como um ser mitológico.

2) A alternativa que transmite ideias vinculadas ao mundo da adulação é:

a) Mas o Rei não era mais o Rei daquele dia.
b) Na cama de marfim, a ideia dormia azul como naquele dia.
c) Envelhecia sem perceber, diante dos educados espelhos reais que mentiam a verdade.
d) Quando a cabeça ficou toda branca, disseram-lhe que já podia descansar e o libertaram do manto.
e) Ideias o Rei não teve mais, nem sentiu falta, tão ocupado estava em governar.

3) O conto narra a história de um rei que mora num castelo, brinca com sua ideia no jardim desse castelo e, para guardá-la, atravessa o corredor das Salas do Tempo até chegar à sala do sono. Nota-se que o espaço predominante é:

a) urbano
b) contemporâneo
c) histórico
d) mítico
e) social

4) Depois de brincarem. o rei adormeceu e, ao acordar, percebeu o perigo de deixar solta sua ideia. Assinale o item que expressa a contiguidade dessa ação:

a) O Rei passou a pensar apenas no seu reino.
b) O Rei decidiu trancar a ideia num cômodo.
c) O Rei chorou por não ter posto a ideia em prática.
d) O Rei deixou o tempo correr sem se preocupar com a ideia.
e) O Rei passou a se sentir triste e solitário.

5) Assinale o item que resume a seguinte passagem do texto “Posta a coroa sobre a almofada.”


a) comiseração
b) piedade
c) complacência
d) desleixo
e) inatividade

6) Nesse conto, o tempo que predomina é cronológico ou psicológico? Transcreva um excerto que comprove sua resposta.


7) A narrativa está centrada na personagem Rei. Em que passagem do conto ele se sente esquecido?

a) – Ninguém mais se ocupa de mim.
b) Sentado na beira da cama o Rei chorou suas duas últimas lágrimas.
c) Quando a cabeça ficou toda branca, disseram-lhe que já podia descansar e o libertaram do manto.
d) Entre ele e a ideia estava todo o tempo passado lá fora.
e) Depois baixou o cortinado, e deixando a ideia adormecida, fechou para sempre a porta.

8) Dentre as personagens do conto, temos a protagonista que é o Rei. Qual a antagonista?


a) ministros
b) ideia
c) tempo
d) Sala do Sono
e) espelhos reais

9) O item que apresenta termos, expressões ou imagens do conto que nos tira do real e nos  leva para o imaginário é:



a) portas fechadas
b) grossa corrente
c) ideia azul
d) sala de marfim
e) cabeça branca

10) Que palavra melhor expressa o tema do texto?



a) cautela
b) melancolia
c) solidão
d) realeza
e) valores

11) O emprego de formas verbais como brincaram (Brincaram até o Rei adormecer encostado numa árvore)  e chorou (Sentado na beira da cama o Rei chorou suas duas últimas lágrimas,...) indicam:

a) fatos que aconteceram em determinados momentos no passado.
b) ações que não foram terminadas.
c) ações que permearam a juventude do rei.
d) fatos inconclusivos do passado
e) ações estáticas ocorridas no passado.

12) “..., linda ideia dele toda azul.”,Com a ideia escondida debaixo do manto...”,” Portas fechadas...” são exemplos de adjetivos que acompanham substantivos no decorrer do texto. Esse recurso:



a) articula todas as partes do texto.
b) possibilita a interação entre leitor e escritor.
c) aproxima o conto da realidade urbana.
d) apresenta afetividade em relação aos substantivos.
e) aguça a curiosidade do leitor.

13) Uma ideia toda azul. O vocábulo toda refere-se ao adjetivo azul e tem sentido de:



a) cada
b) qualquer
c) indevidamente
d) alguma
e) completamente

14) O conto apresenta um Rei que tem a primeira ideia de toda a sua vida, mas guarda a brilhante ideia toda azul só para si e, quando resolve, finalmente, cuidar dela, percebe que o tempo passou, não encontrando a mesma graça, abandona a ideia e a si mesmo. Metaforicamente, o texto:

a) revela os mistérios da alma humana, seus medos, desejos e sentimentos.
b) analisa a atitude do ser humano por meio da personagem do rei.
c) busca resgatar toda a fragilidade da natureza humana.
d) proporciona uma reflexão sobre a existência humana.
e) catalisa a capacidade de empatia das personagens.

15) “Um dia o Rei teve uma ideia.” O conto tem uma introdução típica de um conto de fadas. Uma diferença entre eles é:


a) a existência de conflito.
b) a presença de castelos.
c) o conto não tem final feliz.
d) o confronto não aparece no conto.
e) o conto possui um narrador observador.

16) O fato de o rei desejar guardar sua ideia num local seguro simboliza:



a) uma busca incessante pela felicidade.
b) o desejo de guardar seus valores para si.
c) uma manobra para não perder a coroa.
d) um ato de egoísmo.
e) uma batalha pelo poder.

17) O rei esperou que todos dormissem para encontrar um local protegido para guardar sua ideia. Essa atitude demonstra:



a) prudência
b) insegurança
c) ganância
d) sensatez
e) temperança

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 GABARITO

1) A

2) C

3) D

4) B

5) E

6) Cronológico. “O tempo correu seus anos.” “Envelhecia sem perceber”.

7) A

8) C

9) C

10) E

11) A

12) D

13) E

14) A

15) C

16) D

17) B

 

 

Comentários

  1. Ótimo conto. Ótimos exercícios. Ótimas reflexões.

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  2. Verdade. Bastante profundo esse conto da grandiosa Marina Colasanti.
    Obrigada.

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