ABAD ALFAU E A CAVEIRA Conto colombiano

 


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Até mais ou menos o ano de 1905, via-se no alto da parede chanfrada da igreja do convento de São Domingos, que ficava na esquina da rua dos Estudantes com a rua da Universidade, na capital Dominicana, um nicho vazio, que desapareceu com a parede quando esta foi derrubada.

            Entretanto, nem sempre esse nicho esteve vazio. Dentro dele, apoiada num pequeno suporte de ferro, havia outrora uma caveira, visível durante o dia graças à luz do sol e durante a noite graças à luz de uma lamparina de azeite pendurada no alto e que sempre era acesa ao toque do Ângelus, ao entardecer. Embaixo, como se fossem palavras saídas da boca da caveira, lia-se numa lápide rústica, em letras comuns, quase ilegíveis, escritas em preto:

Oh, tu, que passando vais,

Fixa os teus olhos em mim.

Qual tu te vês eu me vi.

Qual me vejo, tu te verás.

            Muito tempo transcorreu sem que a caveira nem o verso chamassem a atenção do público. Até a noite que um morador do bairro, a caminho de casa, ouviu um ruído proveniente da caveira e, ao voltar os seus olhos para ela, observou que se mexia, inclinando-se para frente ou virando-se de um lado para o outro, como se dissesse:

— “Sim, sim...” “Não, não...”

            Ao ver tal coisa, saiu em disparada até chegar em casa.

            A caveira, que àquela altura já não merecia sequer o olhar indiferente dos transeuntes, passou a ser, no dia seguinte, o tema de todas as conversas. Os prudentes não se aventuravam a passar de noite nas proximidades do convento. E os valentes que se atreviam a fazê-lo juravam que a caveira se mexia dizendo: “Sim, sim...” ”Não, não...” E ainda acrescentavam que ela movia as mandíbulas, que ria fazendo um barulho parecido ao das castanholas e uma porção de outras histórias.

            Durante o dia, a caveira ficava quietinha. Por isso, o encarregado de acender e apagar a lamparina fazia isso sempre de tarde ou de manhã. O problema era de noite.

            Os que moravam por ali, davam uma volta enorme para chegar em casa, a fim de se livrarem de ver a caveira. Nem mesmo os guardas da polícia militar ousavam se aproximar dessa esquina do medo.

            Certa noite, desafiando o seu próprio temor, um desses guardas caminhou nessa direção e, ao ver os meneios da caveira, correu espavorido sem parar até o portão do quartel.

            Abad Alfau tinha então dezenove anos e era subtenente do batalhão que guarnecia a praça de São Domingos. Estava de serviço na noite em que o guarda correu de medo da caveira, e ficou muito contrariado. Na noite seguinte, soube que um outro guarda havia dado uma volta para fugir da bruxaria da esquina e ficou mais contrariado ainda.

            — Ou acabo com essa palhaçada ou não me chamo Abad Alfau! – afirmou ele.

            No dia seguinte, muniu-se de uma espada e esperou que anoitecesse. Mais ou menos às onze horas, dirigiu-se ao tal lugar que tantos temores provocava, levando uma espada na mão e acompanhado de dois soldados. Estavam a poucos metros da caveira, quando começaram os remelexos.

                — Ponham a escada na esquina! – ordenou Abad, antes que o medo paralisasse os seus companheiros.

            De espada na mão, começou a subir. A cada degrau que subia, os movimentos da caveira para frente e para os lados ficavam mais violentos. Quando o subtenente já estava bem próximo dela, a caveira se mexia tanto que parecia querer girar sobre si mesma e de dentro dela saíam uns guinchos agudos. O jovem oficial, no entanto, continuava imperturbável. Finalmente, tão próximo do nicho que poderia alcançá-lo com os dedos, apoiou com força os pés num degrau enquanto com a mão esquerda se agarrava ao degrau mais alto, jogou o corpo para trás e, levantando a espada, acertou-lhe duas pranchadas que a fizeram dar várias voltas.

            E aí se desfez o mistério. Porque debaixo da caveira saiu um rato de mais ou menos um palmo de comprimento, que pulou do nicho para a rua e se perdeu na escuridão da noite, enquanto Abad Alfau, descendo, exclamava:

            — Bicho safado!



(EF89LP29) 1) Os versos “Oh, tu, que passando vais,/Fixa os teus olhos em mim./Qual tu te vês eu me vi./Qual me vejo, tu te verás.” fazem referência a: 

a) vida e morte 
b) juventude e velhice 
c) gratidão e ingratidão 
d) espiritual e imaterial 
e) ser humano e ser inanimado

   

 (EF69LP47) 2) Os verbos do 2º parágrafo ( Entretanto .... eu me vi) havia, era, lia estão escritos no tempo verbal pretérito imperfeito do modo indicativo pois indicam uma ação: 

a) concluída no passado. 
b) ocorrida recentemente. 
c) hipotética, ocorrida no passado. 
d) do passado, já concluída, anterior a outra ação passada. 
e) que acontecia no passado, não terminada em relação ao momento em que se fala.

   

 (EF07LP12) 3) A lamparina que iluminava o nicho com a caveira era acesa ao entardecer. Isso significa que ela era acesa: 

a) no breu
b) na aurora 
c) no solstício 
d) no alvorecer 
e) no crepúsculo

   

 (EF89LP29) 4) Em “...quando esta foi derrubada...”, o item que contém um vocábulo que retoma o pronome esta é: 

a) igreja 
b) nicho 
c) parede 
d) esquina 
e) capital Dominicana

   

 (EF35LP07) 5) Esse conto colombiano data do século: 

a) XVII 
b) XVIII 
c) XIX 
d) XX 
e) XXI

   

 (EF35LP04) 6) O desfecho do conto permite inferir que Abad Alfau era: 

a) robusto 
b) receoso 
c) assustado 
d) indomado 
e) destemido

   

 (EF09LP08) 7) Em “Entretanto, nem sempre esse nicho esteve vazio.” , a conjunção destacada estabelece a coesão com o parágrafo anterior, com sentido de: 

a) adição 
b) conclusão 
c) explicação 
d) adversidade 
e) consequência

   

 (EF09LP08) 8) Um morador do bairro estava a caminho de casa. Um morador do bairro viu a caveira se mexer. Unindo as duas orações por meio de uma conjunção e mantendo a coerência textual, obtém-se: 

a) Um morador do bairro estava a caminho de casa, logo viu a caveira se mexer. 
b) Um morador do bairro estava a caminho de casa, mas viu a caveira se mexer. 
c) Um morador do bairro estava a caminho de casa, quando viu a caveira se mexer. 
d) Um morador do bairro estava a caminho de casa, entretanto viu a caveira se mexer. 
e) Um morador do bairro estava a caminho de casa, assim que viu a caveira se mexer.

   

 (EF09LP05) 9) No excerto “O jovem oficial, no entanto, continuava imperturbável.”, o predicado da oração é classificado como nominal porque: 

a) o adjetivo jovem caracteriza o oficial. 
b) jovem, oficial e imperturbável são adjetivos. 
c) há dois adjetivos na oração: jovem e imperturbável. 
d) o adjetivo imperturbável caracteriza o jovem oficial
e) o adjetivo imperturbável indica o modo do oficial subir a escada.

   

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